20150526

CORDEL: A Luta de Zé do Caixão com o Diabo (Manoel D'Almeida Filho)

A Luta de Zé do Caixão com o Diabo
Manoel D'Almeida Filho
Peleja de Zé do Caixão com o Diabo
Há muita gente no mundo
Que não leva a vida à sério
Não acredita em fantasma,
Assombração nem mistério,
Porque nunca à meia noite
Entrou em um cemitério.

Porque também nunca teve
O Satanás pela frente
Cuspindo carvão em brasa,
No meio de cinza quente,
Voando fogo dos olhos
E brandindo o seu tridente.

Esse nunca viu fantasma
Nem tampouco necessita …
Outro às vezes obrigado,
A junção o precipita;
Força a fazer coisas que
Nem ele mesmo acredita.

Por isso Zé do Caixão,
Um estranho personagem,
Tem no "mundo dos espíritos",
Mostrado a sua coragem,
Filmando para o seu público
Toda espécie de visagem.

Mas numa dessas filmagens,
Antes do cantar do galo,
Zé do Caixão "enrolou-se",
Quase que vai no "embalo",
Dentro do cemitério
O Satanás quis levá-lo.

Houve grande discussão,
Para começar a guerra,
Depois os dois se pegaram,
Tremia da baixa à serra,
Na maior luta que o Diabo
Travou em cima da terra.

A discussão foi tremenda,
Para a luta começar,
Um desafio assombroso
De fazer arrepiar,
Uma briga de gigantes,
Vamos ver quem vai ganhar.

Zé do Caixão uma noite
Foi direto a um cemitério
Fazer uma evocação,
No seu palco de mistério,
Quando bateu meia-noite,
Deu-se aquele encontro sério.

Zé do Caixão evocou
As almas embrutecidas,
Somente aquelas que tinham
Feito mal nas suas vidas,
Chamou até Satanás
O pai das almas perdidas.

Satanás chegou depressa
Disse: - Pronto, meu amigo,
Vá dizendo o que deseja,
Se acaso corre perigo,
Estou aqui resolvido
A levá-lo hoje comigo.

Zé do Caixão respondeu:
- Comigo você não pode,
Deixe de tanta ousadia,
Mofino, cara de bode,
Nojento dos pés de pato
Não dança no meu pagode.

Satanás disse: - Que é isso,
Caça-defunto, bochudo,
Você vai de qualquer jeito
Ou sorrindo ou carrancudo,
Vivo desmaiado ou morto,
Com mala, caixão e tudo.

Zé disse: - Meu camarada,
Você vai entrar na taça,
Com essas pontas de boi,
Tá pensando que eu sou vaca?
Quebro-lhe os chifres de pau,
Corto-lhe o rabo de faca.

Satanás disse: - Não fale
Dos meus chifes nem do rabo
Que chegando no inferno
O seu orgulho eu acabo,
Ponho-lhe estes "enfeites"
Para você virar diabo.

Zé respondeu: - Essa não,
Isso comigo não vai,
Coloque os seus ornamentos,
Se não esse uso cai,
O rabo na sua mãe
E os dois cifres no seu pai.

O Diabo disse: - Um cauda
Não defeitua ninguém,
Eu não tenho mãe nem pai,
Sogro nem sogra também,
Porém duas pontas grandes
Em você acentam bem.

Zé disse: - Eu acho melhor
É que você me respeite,
Deixe a minha vida em paz,
Esse meu conselho aceite,
antes que eu o faça beber
Duzentos tonéis de azeite.

Satanás disse: - Essa agora
É proposta provocante,
Porque não estou doente
Nem sou tão extravagante,
Dê isso à sua vovó
Que precisa de purgante.

Zé disse: - Você agora
Pisou na ponta da vara,
Eu não sei aonde estou
Que não lhe arrebento a cara,
Deixando uma ferida
Que com cem anos não sara.

Satanás disse: - Você
Se fia nesses garranchos
Que estão sobre essas covas,
Atavessando outros ganchos,
Porém isso não faz medo
A quem domina mil ranchos.

Zé disse: - Cabra safado,
Não zombe do Santo Lenho,
Eu me fio em minha força
E na coragem que tenho,
Em todo canto da terra
O meu papel desempenho.

O Diabo disse: - Você
Comigo não se confunda
Você só conheçe a terra,
Eu conheço a baixa-funda,
Da terra até o inferno
A caverna mais profunda.

Zé respondeu: - Satanás,
Você não me faz pavor,
Não temo a sua canalha
Nem o seu reino de dor,
Faço medo a todo mundo,
Eu sou o rei do terror.

Satanás disse: - Pois bem,
Você vai ser compensado,
Vou conduzi-lo comigo,
Já está tudo acertado,
Lá no inferno é que tem
Terror para ser filmado.

Lá você vai encontrar
O mais agradável jogo,
Muitos milhões de esqueletos
Vivos que não fazem rogo
Dançando uns com os outros
Nas labaredas de fogo.

São todos dessas mulheres
Que mesmo sendo casadas
Deixam maridos e filhos
E vão dançar abraçadas
Com outros homens nos bailes
Para serem machucadas.

Tem mais milhões e milhões
De esqueletos recurvados,
Todos de língua de fora
Com dois palmos pendurados
Balançando com dez quilos
Em cada língua amarrados.

São todos dessas pessoas
Que falam da vida alheia,
Fuxicam, levantam falso,
Tem cada língua tão feia,
Tão criminosa e horrível
Que cresce até légua e meia.

Existem outros milhões

Parecem corpos carnais,

Dentro de um lago de fogo,

São filhos maus para os pais,

Falsos, desobedientes,

Nos castigos infernais.

Assim tem diversos quadros
De choro e de muita dor,
Lugares aonde pode
Ser visto o maior horror,
Lá você pode filmar
Toda espécie de terror.

Zé disse: - Muito obrigado,

O seu ponto é negativo,

Na terra mesmo eu encontro

Toda espécie de motivo

Para fazer os meus filmes,

Enquanto eu estiver vivo.

Satanás aborreceu-se
Com toda ira infernal
E disse: - Você agora
Ou vai por bem ou por mal,
Já que não pode comigo
Numa luta corporal.

Zé do caixão disse: - Vamos

Ver dos dois quem pode mais,

Parta para me pegar

Com as forças infernais

Que eu vou me defender com

Meus poderes naturais.

Satanás não conversou
Partiu para pegar Zé
Que deu um pulo de costas,
Firmada na sua fé,
Bem na barriga do Diabo
Meteu a ponta do pé.

Satanás saiu rolando,

Botou as mãos na barriga,

Levantou-se e disse: - Zé,

Feiticeiro de uma figa,

Segure-se, aperte o cinto,

Quero ver se você briga.

Apoiado no tridente
Partiu a Zé do Caixão,
Zé abaixou-se e o Diabo
Passou como um furacão
Bateu numa catacumba
Quase se lasca no chão.

Zé deu uma gargalhada

Vendo o Capeta estirado

E disse: - Você se acaba

Satanás velho, safado,

Caindo assim como sapo

Ó Diabo mole danado.

O Satanás levantou-se,
Rodopiou sobre um pé,
Pulou de braços abertos
Caiu em cima de Zé
Que por baixo imprensado
Quase que perdia a fé.

Porém encolheu as pernas,

Fez o espinhaço duro,

Deu um balão no Capeta

Que voou como um moturo

Por cima das sepulturas,

Foi cair no pé do muro.

Batendo os chifres gritou:
- Zé você me desaponta,
Essa queda foi danada
E se me quebrasse uma ponta,
Eu ia pô-la de ouro
E você pagava a conta.

- Só dessa forma você

Deixaria de ser brabo,

Se quebrasse as duas pontas,

Depois arrancasse o rabo,

Passaria a ser homem,

Nunca mais seria Diabo.

Satanás disse: - Porém,
Quero ser sempre inimigo
Caçando os maus pela terra,
Cada um é meu amigo,
Se eu ficasse bom, vocês
Nunca teriam castigo.

Zé disse: - Você parece

Que está falando em mau

E descansando da queda,

Com medo de levar pau,

Caia no campo da honra

Para eu fazer um sarau.

Satanás rapidamente
Pior que um raio partiu,
Zé meteu-lhe o pé no bucho
Que o bicho preto subiu,
Porém no ar se virou,
Em cima de Zé caiu.

Zé que ali não esperava

Uma rapidez daquela,

Tombou e sentiu o Diabo

Apertando a sua goela

Deitado por cima dele

Pisando em cada canela.

Satanás disse: - Eu agora
Faço de você café,
Vou torrá-lo no meu caco,
Aproveitando a maré;
Começou cuspindo brasa
Queimando as barbas do Zé.

Zé do Caixão apanhando

Agora a torto e a direito

Com Satanás montado

Bem em cima do seu peito,

Sempre com fé procurou

Sair-se de qualquer jeito.

Lembrou-se do karatê,
Deu um golpe com a mão
No gogó do Bicho-preto,
Com tanta disposição
Que o Diabo caiu tossindo,
Cuspindo brasa e carvão.

Nisso Zé aproveitou-se

Enquanto o Bicho espirrava,

Tossia e botava fogo

Que até sufocava,

Deu-lhe outro golpe na nuca,

Quase o pescoço apartava.

Desse golpe o Satanás
Rápido recuperou-se,
Zé descuidado não viu
Quando o bicho levantou-se,
Empurrou-o, deu-lhe uma queda
Em cima dele montou-se.

Zé novamente apertou-se

Somente por um momento

Porque encolheu-se todo

Deu-lhe um balão violento

Que o Diabo subiu rodando
Parecendo um cata-vento.

Desaprumou-se nos ares,
Tonto, sem força de ação,
Abriu as asas porém
Não encontrou direção,
Desceu ainda rodando,
Meteu os chifres no chão.

Levantou-se, sacudiu-se,

Mostrando a maior carranca

E disse a Zé do Caixão:

- Você hoje quebra a banca,

Vai se parar no inferno

Ou vai ou o rabo arranca.

Dizendo assim deu um grito:
- Compadre Forrobodó,
Convoque a turma de choque,
A negra de um peito só,
A mãe de Calor-de-Fogo
E a preta do Bendengó.

Traga a negralhada toda

E venha muito ligeiro

Que eu já levei mais pancada

Do braço de um feiticeiro,

Que nem bombo de Xangô

Ou burro de cachaceiro.

Venha compadre, depressa,
Não me deixe morrer só
Que o macumbeiro malvado
Já deu no meu rabo um nó,
Deixou-me mais apertado
Do que preá em queixó.

De fato, há poucos momentos,

Zé pôde pegar o Diabo

com toda rapidez deu-lhe

um nó bem feito no rabo,

Ele gritava dizendo:

- Com esta agora eu me acabo!


Enquanto Zé do Caixão
A malvadeza fazia,
Puxando a cauda, apertava
O nó, o Diabo gemia
dava pulo e dava grito
Que no inferno se ouvia.

- Compadre, venha depressa

Enquanto o tempo não passa,

Eu estou me derretendo

O corpo virando em massa

Se você não chegar logo,

Não acha nem a fumaça.

Sendo ouvido no inferno
Esse angustioso apelo,
Os diabos todos corriam,
Era o maior desmantelo,
Nunca se viu no inferno
Tanta pressa e atropelo.

Convidando os mais distantes,
As sirenes alarmavam,
Dentro de poucos segundo
Mais de vinte mil chegavam,
Sabendo o que aconteceu,
Para terra se mandavam.
Comandava o batalhão
O general Caifaz,
Cão-coxo vinha a seu lado
Servindo de capataz
Montado na égua velha
Da mãe do rei Satanás.

Acompanhavam também,
Tição, Tinhoso e Canhoto,
Capa-verde e Pé-de-pato,
Mofento, Olho-de-boto,
Parafuso, Cafuçu,
Catapora e Capiroto.

Bexiga-preta e Canguinha,
Trupezupe e Bigodeira,
Bajé, Tangeriça e Cambota,
Mata-calado e Sujeira,
Sanguessuga e Mosca-tonta,
Tráz-cá e Goteira.

Vira-volta e Boca-insossa,
Lambe-lambe e Corta-dedo,
Rompe-ferro, Arranca-rabo,
Cotó e Cachorro-azedo,
Tromba-suja e Caboré
Mofino e Quebra-segredo.

Faísca, Raio e Pacaia,
Futrica, Não-sei-que-diga,
Quebra-faca e Mata-sete,
Mau-olhado e Dou-te-figa,
Cachimbo e Arranca-tampa,
Peitica e Pega-barriga.


Marmim, Motuca e Mosca,
Arranca-toco e Macumba,
Cão-de-bico e Mata-burro,
Fura-olho, Catacumba,
Topa-murro, Quebra-côco,
Gaita, Cuíca e Zabumba.

Bruxaria e Bebe-sangue,
Caranguejeira, Lacrau,
Cascavel, Surucucu,
Carcará e Bacurau,
Onça-pintada e Macura,
Violino e Berimbau.

Tacape, Cordão-de-saia,
Arranca-prego, Corisco,
Quebra-canga, Pirilampo,
Pé-de-peia, Junta-cisco,
Espalha-brasa, Mazorca,
Tapa-boca e Apaga-risco.

Bebe-molho e Maçarico,
Vento-mau, Língua-de-trapo,
Chifre-de-porca e Sarampo,
Ponta-pé, Rabo-de-arraia,
Atadura, Esparadrapo.

Cataclisma e Sapiranga,
Cotoco e Saia-godê,
Rasga-tanga e Carrancismo,
Cata-pulga e Fabelê,
Bode-preto e Cabra-morta,
Fuxico e Cão-é-você.

São estes os poucos nomes
Que nós temos na lembrança,
Vamos ver Zé do Caixão,
Enquanto essa tropa avança,
Apertando o Satanás
Que pulando não descansa.

Zé achava muita graça
No Diabo se lastimando,
ele pegado na cauda
De vez em quando puxando,
Enquanto Satã saltava
Mais o nó ia apertando.

Estava tão destraído,
O nosso Zé do Caixão,
Que não viu Forrobodó
Entrando pelo portão
Com a negraria atrás
Comandando o batalhão.

Satanás disse: - Você
Agora solta o meu rabo
E vai saber quanto vale
Dar nó na cauda do Diabo,
Meu batalhão vem chegando
De quem nunca foge um brabo.

Zé do Caixão disse: - É mesmo?
Deixe essa tropa chegar,
Só assim terei muitos
Chifres para arrebentar,
Negros para dar pancadas
E rabos para amarrar.

Nisso levantou a vista,
Viu negro por todo o lado,
Satanás deu um grito:
- Agora, cabra safado,
Diga que não vai comigo
Para o inferno amarrado?

Zé disse: - Só creio vendo
e deu um puxão sem dó
Na cauda do Satanás
Que vergou como um cipó,
Apertando o laço que
Não há que desate o nó.

O Satanás deu um berro
Que estremeceu toda a terra,
Catacumbas se racharam,
Perto lascou-se uma serra,
Os diabos todos partiram,
Aí começou a guerra.

Pularam em cima do Zé
Mais de dois mil de uma vez
Para esmagá-lo porém
Zé teve mais sensatez,
Na sombra da negraria
Saltou com mais rapidez.

Batendo uns com os outros,
Cairam todos no chão,
Por cima do Satanás
Que imitando a um fogão
Vomitou lavras de fogo
Que parecia um vulcão.

Com esse pulo de Zé,
Deu-se a maior confusão,
Um diabo pegava o outro
Espatifiva no chão,
Pensando ter arrebentado
O nosso Zé do Caixão.

Enquanto Zé foi cair
No pés de Forrobodó,
Vendo o perigo abaixou-se
Pegou-o por um mocotó,
Jogou-o em cima das pontas
Da negra de um peito só.

Foi quando Caifás gritou:
- Negrada pega o bandido
Que alé de ser feiticeiro
É por demais atrevido,
Se não pudermos vencê-lo
Nosso chefe está perdido.

A negralhada caiu
Em cima de Zé, sem dó,
Cacete, vara e tridente
Batiam num homem só,
A poeira levantava
Cobrindo tudo de pó.

Zé debaixo de cacete
Não respeitava ninguém,
Tanto levava pancada
Como batia também,
Mas enquanto dava uma
Recebia mais de cem.

Quando Zé pegava um negro
Dava-lhe um soco na venta
Jogava em cima dos outros
Caíam trinta, quarenta,
Enquanto nas suas costas
Apareciam noventa.

Zé do Caixão se virava
Na frente da negraria,
Pancada por todo o corpo
Era só o que recebia,
Pulava mais que um macaco
Na maior pancadaria.

Zé já pensava consigo:
- Agora mesmo me acabo,
Se Jesus não me valer …
Enquanto gritava o Diabo:
- Agora você me paga
O nó que deu no meu rabo.

Você agora na terra
Nunca mais filma terror,
Vai ser levado comigo
Lá não me peça favor,
Vai pagar tudo o que fez
Num oceano de dor.

Zé respondeu: - Me parece
Que você enlouqueceu,
Quer me levar pela força
Por não saber quem sou eu
Nem que existe um poder
Muito maior que o seu.

O Diabo disse: - Não quero
Que essa lembrança me dê,
Eu sou rei, tenho coroa
E lhe respondo: -Por que
Eu tentei o Salvador
E não carrego você?

 Zé respondeu: - É porque
Você foi buscar d'Ele,
Na intençao de vencê-Lo
Mas foi vencido por Ele
E não pode me levar
Porqueeu confio nEle.

Dizendo isso deu um pulo
Caiu no pé de uma cruz,
Pegou-a dizendo: -  Achei
A espada de Jesus
Para acabar com os diabos
Que vivem sem ver a luz.

Zé do Caixão levantou
A cruz e ficou brandindo,
Só com o vento do lenho
Os negros iam caindo,
Botando fogo, espirrando
Cuspindo brasa e tossindo.

Esses eram aqueles anjos
Do Paraíso jogados
Nas profundezas do abismo
Mas os diabos batizados
Disseram: - Não temos medo
Desses garranchos cruzados.

Assim dizendo partiram
Com vontade de vencer
Mais de setecentos negros
Todos queriam bater …
Porém Zé baixou a cruz
Só ouvia negro gemer.

Nas primeiras cacetadas,
Quase todos resistiam,
Enquanto uns avançavam
Outros caindo gemiam,
Uns recuavam com medo
Porém outros investiam.

Zé do Caixão manejava
A cruz com disposição,
Só via negro caindo
Embolando pelo chão,
Outros correndo assombrados
Atravessando o portão.

Porém enquanto lutava,
Zé do Caixão recebia
Pancada de todo o lado,
Como um leão resistia,
Já vendo a hora cair,
Todo o corpo lhe tremia.

Também porque nessa altura,
Zé sentiu a desvantagem,
A cruz perdeu dois braços,
Os negros com mais coragem
Partiram para vencê-lo
Aproveitando a vantagem.

Zé continuava a luta
agora dando estocada
Porque o tronco da cruz,
Somente de dar pancada,
Tornou-se como um espeto
com uma ponta aguçada.

Em poucos minutos tinham
Mais de cem negros varados,
Se torçendo pelo chão,
Outros de chifres quebrados,
Pernas, braõs, dentaduras,
E só corpos bem machucados.

Porém os que estavam bons
Avançavam como loucos
Batendo em Zé do Caixão
Com pedras, com paus, com tocos,
Numa zoada tão grande
Que já tinham vários roucos.

Contudo continuava
Essa batalha sangrenta
Quando Zé espetava um
Apareciam quarenta,
Zé de tanto levar pau
Botava sangue da venta.

Foi quando num salto brusco,
Rápido como um corisco,
Caiu nos pés de outra cruz,
Ainda correndo risco
Passando a mão encontrou
Um cordão de São Francisco.

Zé mais animado disse:
- Agora não vejo brabo,
Achei a corrente que
Serve para amarrar o diabo,
Vou amarrar um por um
Quebrar chifre e cortar rabo.

Enquanto Zé conversava,
Um negro se destacou,
Partiu pior que uma fera,
Zé fez laço e voou,
Laçado o bicho pulando
Bem nos pés de Zé tombou.

Zé pôs-lhe um pé no pescoço
E disse: - Moleque agora
Você vai me pagar tudo
Ou o seu pescoço se tora,
Mais de dois metros de língua
O negro pôs para fora.

Zé deu-lhes umas cacetadas
e depois pisoteou-o,
Dançando por cima dele,
Pouco a pouco esmigalhou-o,
Depois de todo quebrado
No meio dos outros jogou-o.

Com isso os negros disseram:
- Agora ninguem aguenta
Porque aquela corrente
No lugar que bate esquenta,
Queima mais do que urtiga,
Arde mais do que pimenta.

Zé vendo a moleza deles
Porque nenhum mais não veio,
Pulou por cima do grupo
E foi cair bem no meio,
Meteu o crodão nos negros,
Fez um esbandalho feio.

Tinha negro que corria,
Não acertava o portão,
Como um louco disparado,
Batia no paredão,
Isso por ter recebido
Só o vento do cordão.

Com cinco minutos Zé
Não achava em quem bater,
Só havia pelo chão
Quem não podia correr,
Chorando, se lastimando,
Fazia pena se ver.

Agora mais descansado,
Zé começõu nessa hora
A rezar o Santo Ofício
Da Virgem Nossa Senhora,
Enquanto muitos moleques
Ainda esperavam fora.

Zé continuou rezando
Aquela santa oração,
No "deus salve o relógio",
Houve uma grande explosão,
Foi uma chuva de negros
Que tapou a amplidão.

Nessa hora Zé sentiu
Que o problema era mais sério,
Uma catinga de enxofre
Insensou o cemitério,
Dando uma prova robusta
Do fim daquele mistério.

Zé deixou o campo santo
Já vendo o clarão do sol,
As nuvens brancas, douradas,
Cercando todo o arrebol,
Caminha ouvindo o canto
Do saudoso rouxinol.

Assim foi Zé do Caixão
Levado a mais outro drama
Misterioso, terrível,
Embora fosse na cama,
Isso porque foi em sonho,
Deus dá um mundo risonho
A quem só por Ele chama